sexta-feira, 24 de abril de 2015

Crônica (8) - Luna.

TE ENSINEI CERTIN TE ENSINEI CERTIN HOJE TU TIRA ONDA PORQUE EU TE ENSINE CERTIN ♫♪♪ Olá, vocês! kdjbfkdjb Pois é, cá estou eu com mais uma crônica completamente aleatória - e com uma playlist super-invejável da Ludmilla feat. Cláudia Leitte. Tive essa ideia ontem enquanto estava na Saraiva procurando por Perigosas - sério, alguém tem esse livro? - e putz, por que não escrever isso? ahohahaj Hoje tá tendo gincana lá na escola e ai eu não fui então adivinhem quem vai torcer o pulso de tanto escrever :3333 Anywayyyyy..


boa leitura, flores flores
...


Você tinha certeza que isso ia dar errado. E essa certeza não vinha do espelho quebrado ontem à noite, nem do gato preto de hoje de manhã, claro que não - você não era tão supersticiosa assim. Era tudo questão de uma força maior, que vinha lhe assombrando desde os cinco anos de idade. Porque, falando sério, quais as chances de uma criança de meia década ficar presa uma noite inteira no mercado, dentro do congelador de peixes? Péssimas, péssimas memórias. Ugh.
E como se não bastasse isso, nós tínhamos a coisa com as cenouras, aos oito, a ovelha da tia Marie, no verão do quinto, e os três gansos no parque, quando você tinha, exatamente, doze anos. Era esperado de uma pré-adolescente inteligência o suficiente para não ir chatear os gansos raivosos do lago (era território deles, em que mundo você sairia ganhando?).
Mas hoje, no seu primeiro dia, você tinha a esperança que fosse diferente. Havia dado certo com sua irmã, que estrelara do episódio das cenouras junto com você, e com seu primo, o filho de tia Marie, então por que não daria com você?
E, wow, estava indo tudo incrivelmente bem. Nos primeiros vinte minutos, é claro. A dona do mercado lhe mostrara o local, te dera uma uniforme que, tá, nem era tão ruim assim e havia te avisado para ficar longe do congelador (é, aquela história ficara bem famosa). Você riu, agradeceu e foi se vestir. Ajudou duas garotinhas a acharem seus brownies, atendera um casal de homens que te convidara, logo depois, para um almoço porque ai meu deus ai meu deus ai meu deus vocês são um casal awwww eu quero me casar com vocês!!11!!!1! e até tivera tempo para responder as últimas duas mensagens do Olive. (Enviada às duas e quarenta e sete: Não, Olly, eu não morri. Obrigada pela sua preocupação, você não precisa procurar por mim no freezer. Ainda.). Era um progresso, afinal.
Mas então você ouviu o choro. Puta merda, aquilo era tão alto. Havia uma colega sua no final do corredor onde você estava encostada - você achava que seu nome era Maura - que tratou de dar o fora dali o mais rápido possível, gritando "hora de entrar em ação, novata, mostre-nos seus poderes". E você podia jurar que raios-laser dispararam de seus olhos até ela.
Suspirando, você olhou ao redor. Como é que todas aquelas pessoas haviam sumido tão de repente? Da última vez que você olhara, e isso fazia menos de dois minutos, haviam pelo menos cinco funcionários perto de você. Hora de mostrar seus poderes, novata. Grunhindo, você ajeitou o boné vermelho em sua cabeça (e de repente, o uniforme era sim, muito, muito ruim) e saiu da seção de doces, procurando pelo choro de criança.
E olha que irônico: um garotinho remelento, melecado e estridente berrava de dentro do congelador. Aquilo era algum tipo de brincadeira com você? Há, destino, você é tão engraçado. Largue seu emprego de destruidor de vidas e vá fazer comédia.
"O que aconteceu, fofinho?" perguntou, com o cenho franzido, ao carregá-lo para fora do freezer.
Buáááá. Mais choro. Você se desesperou, pensando no que podia fazer para calar aquele garoto. Agora que estava aqui, a culpa seria sua se os outros clientes fossem embora por causa do choro do bebê que você não conseguia parar.
"Olha, veja pelo lado bom, você ficou com os enlatados." tentou "Te garanto que é duas vezes melhor do que fazer companhia a um bacalhau" mas isso só fez o garotinho chorar ainda mais. "Shh, shh, shh. Fica calmo, calma. Olha, por favor, fica calmo. Ai meu deus, shhh, relaxa. O que você quer? Um pirulito?" o garoto olhou para você, mas continuava chorando. "Oh, sim, um pirulito? Daqueles grandes e coloridos? Olha, eu tenho um. E posso te dar. Mas você vai ter que parar de chorar."
O menino balbuciou, começando a se acalmar.
As crianças de hoje eram tão interesseiras. No seu caso, você choraria até que a pessoa dobrasse a oferta - ou te desse uma revistinha de brinde.
"Uh, certo." você parou, analisando-o de cima abaixo. "O que aconteceu, você vai me dizer agora?"
"Piito" o garotinho disse.
"Quê?!"
"Piito, 'cê me pometeu o piito."
Você bufou, indignada. O garotinho fez beicinho, começando a chorar de novo. Dessa vez, mais estridente e mais barulhento, gritando por seu pirulito.
Era por isso que você escolhera trabalhar no mercado e não ajudar sua mãe na creche. Você não sabia cuidar de crianças. Ia contra todos os seus conceitos ter que pagar com o seu dinheiro um pirulito para aquele garoto - você estava lá para ganhar, não perder mais dinheiro.
"Argh, certo! Eu te dou a porr- o pirulito."
E lá foi você, com a criancinha em seu encalço, procurar por um pirulito num dos caixas. Para sua sorte, o garoto que estava na registradora não falou nada quando você pegou um dos pirulitos e deu para a criança. Só riu um pouquinho da sua desgraça.
"Agora, bebê, já que você tá com seu pirulito, vai me dizer o que aconteceu?" perguntou, se abaixando para ficar na altura do menino. Ele tinha uma blusa listrada que quase não cobria a barriguinha rechonchuda e, melecado daquele jeito, você pensou, por um momento, que tinha deixado um sem-teto entrar no estabelecimento.
Olly iria rachar de rir quando você contasse isso à ele.
"Mãma" foi o que o garotinho disse, tirando o pirulito da boca para falar. Ew, quanta baba.
"Mãma?" você repetiu. "Sua mamãe? Você se perdeu dela?" perguntou, apenas para ter certeza. O garotinho assentiu.
O rapaz no caixa desceu de sua cadeira e agachou-se ao seu lado, sorrindo para você e perguntando para o menininho: "Qual o nome da sua mãe, garoto?"
A criancinha olhou para as duas figuras a sua frente, perdida. Piscou por um momento, mordeu o pirulito e depois, com toda sua inocência, falou; "Mamãe?"
"Sim, qual o nome dela, fofo?" você insistiu, canalizando toda a paciência que você um dia nunca teve. Era seu primeiro dia de trabalho, você não iria estragar isso.
"Mamãe." o garoto repetiu.
"É isso, qual o nome da sua mãe, hein?"
"Mamãe!" o garoto fez beicinho, frustrado.
Você pensou em rebater, mas oh. Aos seus cinco anos, não há razão para você chamar sua mãe de outra forma que não mamãe. Quer dizer, até hoje você não sabia como escrever o nome da sua mãe direito, então quais as chances de aquele menininho saber o nome da mãe dele?
O garoto ao seu lado parecia estar chegando a mesma conclusão.
"E o seu nome, você sabe?"
O garotinho bufou. Pareceu algo como derrotada, como é que eu não vou saber meu nome?, mas você preferiu deixar quieto. "Tom." respondeu, a voz saindo arrastada por causa do pirulito na boca.
"Uh, certo, Tom, você pode vir com a gente até o balcão? A gente vai chamar a sua mamãe." o rapaz disse, se levantando. Você olhou-o por um segundo, e desconfortável com todo aquele homem-mais-alto-que-a-mulher, ergueu-se e conseguiu pelo menos dois centímetros a mais que aquele garoto. Que merda.
O menininho olhou para cima, para os dois.
"Eu te dou mais um pirulito." você falou.
E quando o garotinho resolveu segui-los, seu colega de trabalho virou-se, falando uma única vez: "Dessa vez você paga."
...
Você já tinha uma ideia do que esperar para a mãe do Tom. Oxigenada, plastificada, ralhando com Tom por ter se perdido de sua mãe; aquele tipo de perua. Mas quando uma garota baixinha, ruiva e sardenta entrou em seu campo de visão, você não esperava que ela fosse correr até Tom e puxá-lo para um abraço, chorando em seu ombro. 
Talvez pudesse ser sua irmã, você pensou. 
"Mamãe!" Tom chamou, esganiçado, correndo até a garota.
Ela parecia ter a sua idade, puta merda.
"Oh meu Deus, bebê, que susto você deu na mamãe!" ela dizia, a voz fina. "Nunca mais saia do meu lado, está entendido?"
Bem, de certa forma, suas conclusões não estavam tão erradas. Ela continuou ralhando com o pobre Tom por pelo menos cinco minutos, então se levantou e sorriu para os dois funcionários, arrumando o cabelo ruivo.
Quando se deu conta, ela já tinha se jogado em cima de você.
"Foi você que salvou o meu Tommy?! Obrigada, obrigada, obrigada." dizia, esmagando-a num abraço apertado. De sua visão periférica, você podia ver seu colega de trabalho (qual era o nome dele, afinal?) rindo da sua cara. "Ai meu Deus, desculpa!" a ruiva pareceu notar o que estava fazendo. Afastando-se, te deu tempo para ajeitar novamente seu boné. "Desculpa" repetiu desconcertada "eu sou nova nisso, sabe? De ser mãe. Ainda to aprendendo e nossa, tenho que entender que meu filho não vai ficar do meu lado vendo todos aqueles doces!" ela riu. Você preferiu deixar de fora o fato de que encontrou-o dentro do freezer de enlatados, pelo bem do pobre Tom.
"Uh, não tem problema." você sorriu, desconcertada. "É meu trabalho, acho" mas na verdade, você estava mais preocupada com seu colega de trabalho, que estava vermelho que tanto prender o riso ao seu lado. Você não sabia se chamava uma ambulância ou terminava de sufocá-lo com suas próprias mãos. Que babaca.
"Obrigada, sério!" a garota repetiu. "Onde está seu chefe, você precisa de uma promoção!"
"Não é pra tanto." afirmou.
"Como assim não é pra tanto?!" a garota ruiva olhou-a, chocada. "Você salvou o meu Tommy, tem que ganhar a chave da cidade e-"
"Mommy!" Tommy gritou por ela, apontando para mais um pirulito num dos caixas mais perto. "Piito, eu quer!" com os bracinhos gorduchos, ele tentava puxar mais um da caixa.
"Acho que por hoje chega, garotão, você já teve muitos pirulitos." o garoto ao seu lado dizia, chegando perto de Tommy. 
Por fim, Tom e sua mãe acabaram indo embora. E você escorregou pelo balcão, sentando-se no chão. Você não se lembrava de Leigh, sua irmã, ter te contado uma história assim no primeiro dia de trabalho.
"Primeiro dia?" o garoto te olhou do alto, o rosto ainda vermelho mesmo depois de sua crise.
Você olhou para cima. Cabelos loiros, bagunçados, piercings por todo o rosto e uma tatuagem no pescoço. Se não estivesse com aquele uniforme vermelho, você poderia dizer que ele era até um pouquinho assustador. Mas seu rosto ainda estava vermelho e havia uma covinha em sua bochecha - qual a graça de ter um piercing se essa imagem vai ser destruída assim que você sorrir?
"Você acha?" perguntou, cínica.
 O garoto riu, estendendo a mão. Você segurou-a e se levantou, ajeitando mais uma vez aquele boné vermelho.
"Veja pelo lado bom, tive que lidar com uma crise de asma nos meus primeiros dez minutos. E a única coisa que eu sabia sobre isso era que você precisava de bombinhas - o que, no caso, a pessoa não tinha." o garoto disse, tentando te reconfortar. 
Você olhou-o por um momento, vaga.
Ele sorriu, desconcertado.
"Sou o Dougie."
Dougie, sério? Toda a mágica se foi só com esse nome.
"Uh, prazer." você disse, se afastando.
Dougie olhou-a com o cenho franzido e você pareceu se lembrar da boa educação.
"Ah, é, meu nome é Jade."
Recapitulando: Você conseguira um almoço na casa de um casal gay (e esperava conseguir levar Leigh com você, porque casais gays ai meu deus ai meu deus ai meu deus!!!1!111!!1!), encontrara uma criança tão desafortunada quanto você - que tivera, pelo menos, a sorte de não passar a noite na companhia de um bacalhau - e conhecera Dougie, o cara cheio de piercings e covinhas. E ah, aprendera que Maura, aquela garota de mais cedo, era uma vaca. Wow.
(Para Olive, enviada às quatro e cinco: Você tem que começar a trabalhar, garoto. É coisa de gente maluca!).

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